terça-feira, 29 de novembro de 2011

Cresce população indígena do no Brasil e na Amazônia

Por Marilene Silva

O que durante muito tempo parecia impossível está acontecendo: o número de índios no Brasil e na Amazônia está aumentando cada vez mais. A taxa de crescimento da população indígena é de 3,5% ao ano, superando a média nacional, que é de 1,3%. "O fenômeno é semelhante ao baby boom do pós-guerra, em que as populações, depois da matança geral, tendem a recuperar as perdas reproduzindo-se mais rapidamente", diz a antropóloga Marta Azevedo, responsável por uma pesquisa feita pelo Núcleo de Estudos em População da Universidade de Campinas.
Pajé Nelson herdou uma velha tarefa: evitar que o céu lhes caia na cabeça.
(Foto: Ricardo Stuckert  )
 O extermínio é um risco do passado, e os direitos sobre as terras, assegurados na Constituição de 1988, estão em fase de consolidação, com a ajuda de 100 associações indígenas legalizadas. A maior parte das terras indígenas (98%) está na Amazônia Legal. 
Com terras garantidas e população crescente, pode parecer que a situação dos índios se encontra agora sob controle. Não é bem assim. O maior desafio da atualidade é manter viva sua riqueza cultural. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, havia em torno de 1.300 línguas indígenas. Atualmente existem 170. O pior é que cerca de 35% dos 210 povos com culturas diferentes têm menos de 200 pessoas. Os jumas, por exemplo, viviam no século XVIII perto do Rio Purus, na divisa do Acre com o Amazonas, e eram 15.000 pessoas. Tidos como cordiais e amigáveis, muitos viraram escravos na época da colonização e parte da tribo foi dizimada. Na década de 90, restavam apenas três representantes da etnia: duas velhas índias, Baru e Inté, e o jovem guerreiro Karé, morto por uma onça há quatro anos. Foi o fim de mais um povo indígena e de sua cultura. "Cada vez que isso acontece, o prejuízo é terrível, incalculável", diz Carlos Alberto Ricardo, coordenador do Programa Rio Negro, do Instituto Socioambiental.
Índios ainda vivem como antigamente. (Foto: Ricardo Stuckert)
Entre os povos ameaçados estão os ianomâmis, que foram os últimos a ter contato com a civilização. Vivendo nas cabeceiras dos rios Negro e Branco, sua população atual chega a pouco mais de 8.000 pessoas. O encontro com garimpeiros, que invadem suas terras, trazendo doenças, violência e alcoolismo, abala a estabilidade do povo. No final da década de 80 e no início da de 90, 2.200 ianomâmis morreram em virtude da malária, em primeiro lugar, e da violência. Entre os índios, os garimpeiros são conhecidos por outro nome: os "comedores de terras". Calcula-se que 300.000 garimpeiros entraram ilegalmente em terras indígenas na Amazônia. Mas o problema não é insolúvel. Na aldeia Nazaré, onde moram 78 ianomâmis, foram expulsos pela Polícia Federal. E, sobretudo, já existem lugares onde a cultura indígena convive bem com a chegada da civilização, como no município de São Gabriel da Cachoeira.

A aldeia Nazaré, na área rural de São Gabriel Cachoeira, é um bom exemplo de como muitos índios da Amazônia ainda conseguem viver como seus antepassados. O tuxaua Mateus Cós Santos, de 49 anos, chefe da tribo, sabe da riqueza da região, que segundo os geólogos é farta em jazidas de ouro. Admite que "ganhar dinheiro pode ser importante", mas depois de algumas prioridades. Na realidade, os índios ainda vivem como antigamente, em comunidade. Partilham o que ganham e produzem coletivamente, ajudando tribos vizinhas na caça e na pesca. Entre eles, não existe propriedade privada. Ainda têm outras coisas com que se preocupar. Evitar que o céu caia sobre suas cabeças, por exemplo. Cabe aos pajés Nelson, Renato e Manuel, através de suas rezas durante as quais cheiram um pó chamado pariká, feito com ervas que lhes permitem conversar com os espíritos, evitar a tragédia, mantendo equilibradas as colunas que sustentam o mundo de cima.
Foto: Ricardo Stuckert
O esforço das autoridades para manter a diversidade cultural entre os índios pode evitar o desaparecimento de muita coisa interessante. Um quarto de todas as drogas prescritas pela medicina ocidental vem das plantas das florestas e três quartos foram colhidos a partir de informações de povos indígenas. Na área da educação, a língua tucana, apesar do pequeno número de palavras, é comparada por lingüistas com a língua grega por sua riqueza estrutural possui, por exemplo, doze formas diferentes de conjugar o verbo no passado. Permanece a questão de como ficará o índio num mundo globalizado, mas pelo menos já se sabe o que é preciso preservar.

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